quinta-feira, 10 de setembro de 2009

poema

HOTEL ESCRITO EM LETRAS VERMELHAS

Há muitas sombras e a palavra hotel
está escrita com letras vermelhas
e arde sobre a fachada de uma casa
em ruínas. Ouve-se as prostitutas
e também o alucinado discurso
que em língua estranha o chinês vocifera.
O que não sei é por que visitar
lugares entregues ao desamor
e à sordidez – a resposta, talvez,
seja apenas tola filosofia.
Mais relevante é a chuva: iminente
porque as nuvens estão muito vermelhas
e porque o vento torna insuportável
o denso cheiro de gordura podre.
Porém insisto: tudo é a vida –
eis, talvez, a resposta; ou então
A resposta não existe e perdura
apenas enquanto vejo sair
das sombras a sombra de uma mulher
que vem em minha direção: cruzamos
e o rosto claro vejo – palidez
e candura fugazes, quase etéreas.
No entanto há os olhos, e os olhos
queimam mais raivosos do que a palavra
hotel grafada em símbolos vermelhos.
São estes olhos que acham os meus
e que depois somem, enlouquecidos
pelo tédio das ruas negras, sujas.
No entanto, tudo é vida, e a resposta
- talvez – é que há mulheres belíssimas
vencidas pelo desamor, talvez
pela sordidez; corpos possuídos
pelo demônio que mais berra quando
as noites são trevas irredimíveis
e quando ventos de chuva a cidade
varrem e adivinham que existe mais
do que a selvagem solidão da carne
e o gélido abandono do espírito.

4 comentários:

  1. Por vezes, o amorfo, o mais estranho nos traços de vida, são os que mais a demonstram.
    Gostei do texto.

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  2. Sorrio, contente: decassílabos num poema com a "velha» cor e cheiros de Ribeirão.

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  3. Amélia, Nayara, Nuno - feliz pela visita de todos aqui. Nuno, o poema tem a velha cor de Ribeirão porque é um velho poema. Abraços para todos.

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