ÚLTIMO POEMA PARA A TRISTEZA DE MILDRED
Como dizer que a sua tristeza
é o poema que desejo escrever?
Até sobre a sua alegria sei pouco.
Eu só a conheço debaixo do sol:
não sei se os seus olhos, castanhos,
continuam castanhos quando chove
ou se escurecem como os olhos
de uma mulher que amei certa vez.
Também nunca a vi dormindo;
não sei como a primeira luz da manhã
desliza sobre o seu rosto
e também não sei se essa mesma luz
faz o castanho dos seus olhos
brilhar como mel refletindo o sol.
Tampouco sei o gosto de seus beijos
e nunca ouvi as canções que você ouve
quando se descobre enamorada.
Conheço apenas o seu riso
e como o sol, no rigor do meio-dia,
enrodilha-se em seus cabelos ruivos.
Uma vez você disse estar triste
mas a tristeza me pareceu timidez
e tímido eu não soube ir além
de seus olhos, seu pudor, sua tristeza.
Tampouco sei o que é amar
durante o tênue mês de maio.
Foi em novembro que tive
aquela guria cujo azul dos olhos
se acizentava nas tardes de chuva.
Após ela pensei que você seria a mulher
que um homem tem após aprender
a amar e a perder o que ama.
Mas tão distantes nos mantivemos
e no entanto ainda há um resto de luz:
com essa luz invento a sua tristeza
(contempla a minha inútil ternura!)
e sob essa luz (luz que predece o inverno)
vou percebendo qual é a chaga de sentir
dentro do próprio peito um fruto
maduro e ainda não colhido.
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Oi, Daniel. De vez em quando venho visitar O Céu. Na verdade te visito desde O Desaparecido. Me encanta e inquieta um pouco a perseverança de seus temas, de sua linguagem, dos poemas. Talvez porque sou dispersa demais, e facilmente esqueço o que já fiz. Mas continuo gostando daqui.
ResponderExcluirobrigado, adelaide, por ser uma leitora tão assídua.
ResponderExcluirreconheço que alguns temas se repetem sim: as garotas, o decair da luz, a tensão da carne. mas por que isso a inquieta?
obrigado pelas visitas